Por Horácio Vilela
Para nós respirar é sinónimo de vida. Da primeira à última, a respiração caminha connosco ao longo das nossas vidas ininterruptamente. Na maioria das vezes nem nos apercebemos que estamos a respirar, acontecendo em segundo plano, mas a forma como o fazemos nem sempre é igual ou inconsequente. A respiração, assim como muitas outras coisas, é tanto um fator quanto um efeito do nosso estado mental, ou seja, a maneira como respiramos afeta a nossa percepção da mesma forma que a nossa percepção afeta a respiração. Sabendo disso, várias técnicas de respiração foram desenvolvidas ao longo do tempo na tentativa de modular ou promover um certo tipo de experiência psíquica. A chave comum a todas é o trazer da consciência ou da atenção à respiração, o que por si só espoleta efeitos diferentes — alguns mais psicológicos (e.g., poder silenciar os pensamentos ao redirecionar a atenção para a respiração) e outros mais psicossomáticos (e.g., hiperventilar intencionalmente para alterar os processos químicos cerebrais e, com isso, a qualidade da percepção). Em certa medida, a respiração tornou-se algo mais do que um processo autónomo e inconsciente, numa espécie de ferramenta (ou mesmo arte) com a qual podemos provocar voluntariamente estados alterados de consciência que nos permitam ter experiências significativas (ocasionalmente).
Do ponto de vista da psicoterapia, o interesse reside na análise dessas experiências extraordinárias e às vezes numinosas (ou religioso-espirituais), com o intuito de ajudar na sua significação e integração de forma a enriquecer as nossas vidas. O abrir das portas da percepção para podermos mergulhar nas nossas profundezas ou subir a escada de Jacob até aos sete céus é absolutamente vital para qualquer ser humano; mas sem orientação adequada isso pode se demonstrar vão ou até potencialmente prejudicial. Pois sozinhos podemos perder de vista o significado e função destas experiências, efetivamente desperdiçando o seu potencial para promover mudança e crescimento. Às vezes até nos podemos perder nesses mundos aparente estranhos, correndo o risco de sermos engolidos e acabarmos pior do que antes. Assim que o papel do psicoterapeuta (neste contexto específico) é prevenir tais contratempos e ajudar a extrair o máximo de proveito possível destas experiências. Em síntese, o breathwork e a psicoterapia podem e devem colaborar numa espécie de relação yin-yang, onde um catalisa e outro contextualiza, para potenciar o caminho do psiconauta.
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